10 de dezembro de 2008

Os padrões da sensualidade

Muitos rapazes são enganados pela visão de “mulheres desregradas ou, no mínimo, vulgares e de baixo nível”. E embarcam no casamento com idéias exageradas sobre satisfação sexual. Não compreendem que “as melhores mães, esposas e donas-de-casa, pouco ou nada entendem de prazeres sexuais. O amor ao lar, aos filhos e às tarefas domésticas são as únicas paixões que sentem”. Algumas mulheres que se consideram excelentes esposas e mães podem ter outra opinião. E podem ter fortes argumentos a seu favor. Ainda assim, a idéia de que há algumas diferenças entre apetites sexuais masculino e feminino típicos, e que o apetite sexual masculino é menos exigente, recebe forte respaldo do novo paradigma darwinista. Aliás, a premissa recentemente popular que homens e mulheres têm basicamente naturezas idênticas conta cada dia com menos defensores. Deixou de ser, por exemplo, uma doutrina central do feminismo. Uma escola inteira de feministas - as “feministas da diferença”, ou “essencialistas” - agora aceita que homens e mulheres são profundamente diferentes.

As mulheres promíscuas seriam bem-vindas como parceiras sexuais de curto prazo - e de certa forma até preferíveis, pois pode-se conquistá-las com menos esforço. Mas não serviriam para esposas, por serem um conduto duvidoso para investimento masculino em filhos. Podemos imaginar a corte, entre outras coisas, como um processo de classificar a mulher em uma categoria ou outra. O teste correria mais ou menos assim: se você encontra uma mulher que parece geneticamente apropriada para um investimento, comece a passar muito tempo com ela. Se parecer interessada em você, mas permanecer sexualmente indiferente, ela passou no teste. Se, por outro lado, parecer ávida para ter uma relação sexual imediatamente, então, por favor, faça sua vontade. Mas se você obteve sexo com tanta facilidade, talvez queira passar do modo investimento para o modo exploração. A avidez que ela demonstrou pode significar que sempre será facilmente seduzida - uma qualidade indesejável em uma esposa. Naturalmente, no caso de uma determinada mulher, a avidez sexual pode não significar que ela sempre será facilmente seduzida: talvez seja você o único homem irresistível. Mas se existir correlação geral entre a rapidez com que a mulher sucumbe e a sua probabilidade de vir a enganá-lo, então essa rapidez é um indício estatisticamente válido para uma questão de enorme conseqüência genética.

Há uma teoria segundo a qual algumas mulheres são inatamente propensas a perseguir a estratégia do “filho sexy”: cruzam promiscuamente com homens sexualmente atraentes (bonitos, inteligentes, musculosos, e assim por diante), pondo em risco o alto investimento masculino nos filhos que poderiam obter se fossem mais santas, e tivessem a probabilidade de terem filhos como os pais, atraentes e, portanto, prolíficos. Quanto mais atraente for uma adolescente, tanto maior a sua probabilidade de “casar bem” - casar com um homem de condições sócio-econômica mais elevada. Quanto mais ativa sexualmente for uma adolescente, tanto menos possível que isto ocorra. Um macho rico de condição social elevada em geral tem à escolha uma ampla gama de candidatas a esposa. Portanto tende a escolher uma mulher bonita que é também relativamente santa. Em outras palavras, talvez as adolescentes que recebam desde cedo uma resposta social confirmando sua beleza, tirem partido disso, e se tornem sexualmente reservadas, encorajando, assim, os investimentos de longo prazo de machos de posição elevada que procuram santas bonitas.

As mulheres menos atraentes, com menores chances de acertar na loteria por meio de reserva sexual, tornam-se promíscuas, e extraem pequenas parcelas de recursos de uma série de homens. Embora tal promiscuidade possa, de certa maneira, reduzir o valor dessas mulheres como esposas, não teria, no ambiente ancestral, anulado suas chances de encontrar um marido.

A promiscuidade está instalada no cérebro masculino, é uma herança da evolução. Através da história, os homens morreram em guerras e mais guerras. Assim, fazia sentido tentar de qualquer jeito aumentar a população. Sempre voltavam menos guerreiros. Mas os sobreviventes tinham à sua disposição cada vez mais viúvas, criando um harém que servia muito bem à estratégia de preservação da espécie.

Esta imagem da mulher moderna passada pela mídia, a devoradora de homens e maníaca por sexo, é uma criação do imaginário masculino e não corresponde a 1% da população feminina. Como muitas mulheres não conseguem corresponder às imagens que vêem, começam a pensar que não são normais. E os homens, estimulados a acreditar no grande apetite sexual feminino, ficam aborrecidos e frustrados se suas parceiras não tomam a iniciativa com freqüência. A mulher tem a mesma necessidade de sexo de suas mães e avós, só que estas reprimiam e não falavam sobre o assunto.

Os homens podem reproduzir centenas de vezes por ano, presumindo que consigam persuadir mulheres suficientes a cooperar, e presumindo que não existam leis contra a poligenia - o que com certeza não havia no ambiente onde grande parte de nossa evolução ocorreu. As mulheres, por outro lado, não podem reproduzir mais que uma vez por ano. A assimetria reside parcialmente no alto custo dos ovos; em todas as espécies eles são maiores e em menor número do que os minúsculos espermatozóides produzidos em massa. Assim, mulheres têm que ter cuidado com a forma de gastá-los. Nove meses de investimento, sem contar, os cuidados, o tempo e a energia que terão de ser investidos na cria depois.

Mulheres, por instinto, devem ser cuidadosas. Mais que os homens. Nada de sair comprometendo óvulos por aí, porque o investimento que terão de fazer mais tarde é incomparavelmente maior que o deles. Dar à luz uma criança exige um enorme investimento de tempo, sem falar da energia, e a natureza estabeleceu um baixo patamar para o número de projetos do gênero que ela pode realizar. Assim cada criança, do ponto de vista (genético), é uma preciosa máquina de genes. Sua capacidade de sobreviver e, por sua vez, produzir a própria máquina de genes, tem uma enorme importância.

Faz sentido em termos darwinistas, então, que uma mulher seja seletiva com relação ao homem que vai ajudá-la a construir sua máquina de genes. Para a fêmea, “a cópula pode significar o compromisso com um encargo prolongado, tanto no sentido mecânico, quanto fisiológico, com as suas conseqüentes fadigas e perigos”. Portanto é de seu interesse genético “assumir os encargos da reprodução” apenas quando as circunstâncias parecem propícias. E “uma das circunstâncias mais importantes é o macho inseminador”; uma vez que “pais excepcionalmente aptos tendem a gerar filhos excepcionalmente aptos”, é “vantagem para a fêmea escolher o macho mais apto disponível...”. Donde a corte: “a publicidade que o macho faz de sua aptidão”. E da mesma forma que é vantajoso para ele fingir ser extremamente apto, quer seja, quer não, é vantajoso para a fêmea identificar sua falsa publicidade.

Assim sendo, a seleção natural cria “um sofisticado talento para vendas nos machos e uma sofisticada discriminação e resistência à vendas nas fêmeas”. Em outras palavras: os machos devem, em teoria, tender ao exibicionismo (avidez) e as fêmeas ao resguardo (recato). Se aceitarmos ao menos três modestas afirmações - (1) que a teoria da evolução natural implica diretamente a “aptidão” das mulheres que são seletivas com relação a seus parceiros sexuais e dos homens que em geral não o são; (2) que a presença e ausência dessa seletividade são observadas em todo o mundo; e (3) que tal universalidade não pode ser explicada com igual simplicidade por uma teoria concorrente e puramente cultural - e se estivermos jogando de acordo com as normas da ciência, teremos que endossar a explicação darwinista: a licenciosidade masculina e o (relativo) recato feminino são até certo ponto inatos.

Mulheres tendem a ser, como regra geral, exigentes e chatas na escolha de seus homens. Mas não podem ser exigentes e chatas demais, senão não copulam, e adeus genes! O mesmo risco correm os homens afoitos ansiosos por copular e engravidar todas as mulheres do mundo. Se desenvolverem uma reputação de copular e abandonar a fêmea sem ajudar, um pouco que seja, no cuidado da cria, correm o risco de ficar a ver navios. Acabarão sendo rejeitados, preteridos por outros homens mais “geneticamente corretos”, e seus genes não se propagarão. A tentação da trapaça na relação macho-fêmea existe, mas o jogo não é necessariamente de soma zero. Isto é: não é necessário que alguém perca para que alguém possa ganhar. Ambos - macho e fêmea - querem propagar seus genes, portanto, ambos podem ganhar. Algum tipo de estratégia de cooperação deverá se desenvolver. Por interesse.

A seleção natural acaba provocando o aparecimento de comportamentos de equilíbrio. Essas são as estratégias que acabam levando ao compromisso entre os interesses - naturalmente egoístas - de macho e fêmea. Assim, o jogo do sexo é inerentemente conflituoso; ele foi embutido nas psicologias de homens e mulheres à imensidão do tempo evolucionário. O que engendra esse conflito é a diferença essencial entre ambos: espermatozóides são abundantes e baratos; óvulos são poucos e caros.

Fontes:
BLAIR, Dique. A lógica de puppeteer. Internet.
NOBREGA, Clemente. O glorioso acidente. Editora Objetiva.
PEASE, Alan e Barbara. Por que os homens fazem sexo e as mulheres fazem amor?
WRIGHT, Robert. O animal moral. Editora Campus.

Nenhum comentário: