21 de maio de 2010

Misticismo

Se existe algo em mim que pode ser chamado de místico, esse algo é a admiração ilimitada pela estrutura do mundo tão longínqua quanto a nossa ciência pode revelar. O mistério da vida me causa a mais forte emoção. É o sentimento que suscita a beleza e a verdade, cria a arte e a ciência”. (Albert Einstein)  

Existem na internet milhares de sites e e-mails com crendices, boatos e lendas urbanas que sempre encontram alguém crédulo o bastante para acreditar nelas e as espalhá-las aos quatro ventos. Nesse mundo imaginário de fantasmas, anjos, bruxas, demônios, duendes, fadas, gnomos, videntes, curandeiros, auras, encostos, mandingas e discos voadores, nosso desejo em crer no extraordinário é alimentado. As paixões humanas que mais contribuem para este caminho são o medo e a esperança. A morte, a doença e a paixão abalam profundamente as pessoas, chegando a ponto de perderem a razão e o juízo. 

No princípio seus seguidores tentam vincular suas idéias à ciência. São as pseudociências (falsas ciências). Depois que não são acobertados por ela, passam a odiar a idéia de conviver com suas explicações sobrenaturais sem a validação da ciência. Então passam a dizer que ela pouco se importa com esses acontecimentos; que é conspiratória; que é fria; que não tem uma visão holística do Universo. Eles abominam a idéia de que a ciência pouco se importa com os fenômenos místicos. E para comprovar suas “teorias”, como “prova”, passam a se utilizar de relatos ou testemunhos. Entretanto, suas alegações são impossíveis de serem testadas, porque se baseiam em experimentos que só podem ser observados ou sentidos por aqueles que neles acreditam – “se já é difícil provar a existência de algo que existe, imagine provar a inexistência de algo que inexiste”. 

Nesse imaginário, aproveitando-se das circunstâncias, entram em ação os videntes, hábeis manipuladores que jogam com o medo e a esperança das vítimas, as quais raramente percebem quão habilmente são iludidas e manipuladas. De um lado, um “cliente” fragilizado e sincero, que perdeu a fé na sua fé. Do outro lado, um “profissional” com um vasto conhecimento de uma tradição milenar, ardiloso, que usa a “leitura fria” como método. 

Leitura Fria é uma estratégia usada por manipuladores para fazer com que uma pessoa se comporte de uma certa forma, ou a pensar que os que fazem a leitura têm algum tipo de capacidade especial que “misteriosamente” permite que saibam coisas sobre um acontecimento. O manipulador faz uma meticulosa observação da vítima e utiliza também conhecimentos estatísticos e gerais da natureza humana.  Começa a interagir com a vítima, fala o óbvio de um modo enigmático ou interrogativo e observa cuidadosamente a reação da pessoa (“joga verde”): você está deprimida! alguém a deixa muito infeliz... E a vítima prontamente responde: é meu filho! Começa falando sobre generalidades e em pouco tempo já está adivinhando detalhes íntimos da vítima. Na verdade é a vítima quem está revelando tudo, o vidente apenas traduz a linguagem em um português nem sempre bem claro. Fazendo perguntas vagas e obtendo respostas sinceras, conseguirá ao final dar um veredicto do caso.

VEREDICTO: Conforme sua formação espiritual dirá que é: o carma; um feitiço; o demônio; um encosto, etc.  

TRATAMENTO: Conforme sua formação espiritual recomendará: um trabalho espiritual; um desmancha feitiço; um exorcismo; uma unção; muita reza; um desencosto.   

OBSERVAÇÃO: Seja qual for o tratamento a ser seguido, o vidente solicitará que prossiga com o tratamento médico prescrito (é indispensável). Assim, se o paciente tiver o sucesso desejado, ficará em dúvida se foi a medicina ou a quiromancia quem o curou. Se o tratamento for de difícil solução, solicitará mais “trabalhos” e mais rezas. Se não tiver a solução esperada, dirá que é ou foi o karma; um feitiço bem feito; que a vida assim quer ou quis; que é ou era seu destino; e assim por diante. 

POR QUE OS “TRATAMENTOS” PARECEM FUNCIONAR: Muitos métodos dúbios permanecem no mercado principalmente porque satisfazem consumidores que oferecem testemunhos de seu valor. A seguir algumas razões pelas quais as pessoas podem erroneamente concluir que um tratamento ineficaz funciona:  

1) A doença pode ter seguido seu curso natural; 
2) Muitas doenças são cíclicas; 
3) O efeito placebo pode ser o responsável; 
4)  O diagnóstico ou prognóstico original pode ter sido incorreto; 
5) Melhora temporária do humor pode ser confundida com cura.   

Nunca acredite em testemunhos, não são prova! Se alguém alega ver, ouvir ou sentir entidades irreais, creia: está tendo devaneios. O antídoto para essas crenças místicas é aquilo que todas elas no fundo combatem: a razão. No dizer de Sêneca:  “Se queres submeter tudo a ti mesmo, submete-te primeiro à razão”. 

Além do mais, para que procurar um intermediário (quiromante) se Deus é onisciência, onipotência, onipresença e benevolência? 

JC Coutinho

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