15 de setembro de 2010

O mistério da consciência

Esteve em Porto Alegre, participando do Fronteiras do Pensamento, o cientista social e economista, Eduardo Giannetti, um dos economistas mais respeitados do Brasil. Seu tema, A Ilusão da Alma: A Dualidade entre Mente e Cérebro, ou, mais especificamente, a nossa consciência - seria ela controlada pela nossa mente ou pelo cérebro, à revelia de nossas próprias vontades?
Na entrevista concedida por telefone de São Paulo à RBS, antes do evento, Giannetti explica essas teorias e aponta que os avanços científicos na área só vêm a comprovar o quanto o homem sabe pouco sobre sua própria condição.
Agência RBS: Seu livro é uma ficção que fala sobre a dualidade entre mente e cérebro. A conferência desta segunda-feira vai aprofundar esse tema?
Eduardo Giannetti: Sim. Vou falar sobre as duas correntes filosóficas que definem essa dualidade. A primeira, o mentalismo, está afinada com a nossa psicologia intuitiva, com as crenças espontâneas que nós temos sobre como se dá essa relação. Sua idéia básica é de que a mente governa nossos pensamentos e nossas ações. Já a segunda, que vem se tornando cada vez mais plausível à medida que avançam os estudos no campo da neurociência, é o fisicalismo. Segundo ele, é o cérebro que domina completamente as nossas ações e os nossos sentimentos e que, por isso, nossas sensações de identidade e liberdade provavelmente são enganosas. No livro, o meu protagonista começa a estudar o assunto após ter um tumor cerebral. Quer dizer, ele entra num tema que preferiria não ter entrado. É convencido a entrar pela lógica e pelas evidências empíricas.
Agência RBS: O avanço da ciência comprova que o fisicalismo está certo, e o mentalismo, errado?
Giannetti: Esse assunto foi debatido durante 2,5 mil anos por filósofos e teólogos sem que houvesse qualquer tipo de base experimental ou de evidência empírica. De 20 ou 30 anos para cá, com o avanço da neurociência e de áreas afins, é que começam a surgir os primeiros resultados práticos sobre esse assunto. À luz desses resultados, o fisicalismo – que era defendido na Grécia por Demócrito; no Iluminismo, por La Mettrie; no século 19, por Thomas Huxley; no século 20, por uma série de cientistas – vem ganhando muito terreno. Vai se firmando, ao que parece, como “a verdade” no que diz respeito à relação entre cérebro e mente.
Agência RBS: O que, em síntese, constitui essa verdade?
Giannetti: A conclusão básica que tiro do estudo desse assunto é que nós, humanos, podemos estar radicalmente enganados sobre o tipo de ser que acreditamos ser. Assim como vemos com clareza que o homem pré-científico estava enganado sobre a natureza externa – o relâmpago, o arco-íris, as estrelas –, pode ser que estejamos igualmente enganados sobre a nossa natureza interna. Nosso desconhecimento sobre o bicho homem, digamos assim, ainda é muito profundo. As descobertas recentes vêm demonstrando a extensão do provável equívoco geral sobre quem somos e sobre o que nos faz agir como agimos. Nosso grau de desconhecimento sobre nós mesmos é absurdo. É comparável ao que achávamos ser o universo antes da descoberta de que a Terra não é quadrada. Deveríamos ter mais humildade ao falar sobre nós mesmos.
Agência RBS: Por que, ao escrever sobre esse tema, o senhor escolheu fazer ficção, algo que nunca havia feito, e não um ensaio?
Giannetti: Acho o tema fascinante. Para mim, é a grande fronteira do mundo científico. É nesse campo que me parece residir o grande enigma da condição humana no mundo natural. A opção pelo romance é porque, mais do que considerar verdades e falsidades sobre essas teorias, eu estava interessado em mostrar o que acontece com alguém que por algum motivo passa a acreditar nessa hipótese espantosa que é o fisicalismo.

Fronteiras do Pensamento - ZH 11/09/2010

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