22 de setembro de 2025

COMO NOSSOS ANCESTRAIS

A ciência indica que, ao escolher um parceiro, ainda somos guiados por nossa biologia e preferências evolutivas. 

HOMEM
exibicionista, alto, forte, caçador habilidoso e dominador;
menos seletivo: seu objetivo é engravidar o maior número possível de parceiras para propagar seus genes.

MULHER
recatada, jovem, saudável e com potencial para gerar muitos filhos;
mais seletiva: seu objetivo é engravidar de um macho capaz de lhe dar a prole mais apta a sobreviver e encontrar um provedor que a ajude a alimentar e proteger os filhos.

O homem ideal seria alto, forte, caçador e dominador, interessado em fecundar o maior número de parceiras. A mulher ideal seria jovem, saudável, com potencial reprodutivo e mais seletiva, buscando um provedor para a prole mais apta. Esses protótipos de “macho e fêmea alfa” do tempo das cavernas ainda guiam nosso comportamento sexual.

Milhões de anos se passaram, mas o comportamento sexual humano continua a seguir os mesmos mecanismos ancestrais. A herança evolutiva explica, por exemplo, por que sexo e status estão intimamente ligados. Segundo a jornalista Candace Bushnell, autora de “Sex and the City”, a escassez de “machos alfa” faz com que muitas mulheres vejam suas iguais como inimigas. Afinal, passamos apenas 1% da nossa história evolutiva sob a civilização, e os 99% restantes estiveram à mercê de nossos instintos.

O naturalista Charles Darwin defendia que a evolução se baseia na sobrevivência dos mais aptos, onde o cérebro seria uma ferramenta de sobrevivência e o sexo, uma mera consequência. No entanto, uma nova teoria sugere que a procriação é a meta principal da evolução, e as estratégias para transmitir genes são centrais. Assim, o cérebro humano é visto como uma “máquina de cortejar”, um ornamento sexual, como a cauda do pavão, que nos torna atraentes por meio da conversa, humor e inteligência.

A evolução, ao nos dar a inteligência, misturou os apelos biológicos com a cultura. Para o estudioso Geoffrey Miller, a arte, a música e a linguagem são táticas de seleção sexual e conquista. Ele acredita que somos o que somos para nos acasalar melhor. As mulheres buscam os melhores genes, e os homens e as mulheres usam biologia e sentimentos em um grau que é quase impossível distinguir.

Segundo Steven Pinker, enquanto em outras espécies o desejo sexual visa a propagação dos genes, para nós ele visa o prazer sexual, que é a estratégia dos genes para se propagarem. O prazer é tão crucial que ele pode explicar por que os homens têm o maior pênis entre os primatas: as mulheres, que controlam a seleção sexual, apreciaram o estímulo tátil de um órgão maior, e isso levou à sua evolução.

A busca pela beleza tem origens muito anteriores à indústria da moda. Os padrões de beleza, embora variem culturalmente, obedecem à constantes como a diferenciação sexual (seios e cintura fina para mulheres; queixo forte e musculatura para homens) e a simetria, um sinal de saúde genética. A beleza ativa áreas cerebrais antigas, ligadas ao prazer e ao vício, mostrando que é um vício humano cultivado por milhões de anos.

Preferências ancestrais, como a preferência feminina por homens mais altos (sinal de saúde e bons genes), ainda ditam nosso comportamento, mesmo que pareçam contradizer a lógica moderna. A escolha de um empresário poderoso, porém baixo, por mulheres altas, por exemplo, demonstra que ele compensa a falta de altura com sua capacidade de provedor.

A igualdade entre os sexos é uma quimera, pois os cérebros masculino e feminino funcionam de modo diferente. Os homens tendem a ser “sistematizadores” (resolvendo problemas), e as mulheres, “comunicadoras” (avançando na linguagem). Estudos de ressonância magnética mostram que o cérebro feminino tem mais áreas ativadas pela emoção, o que explica por que elas se lembram de detalhes de experiências passadas, enquanto eles não.

Outra diferença acentuada nas mulheres é a ovulação oculta. Essa característica ofereceu vantagens evolutivas: nos primórdios, tornava difícil determinar a paternidade e protegia os filhotes de machos rivais. Com a civilização, passou a manter os parceiros interessados, já que a incerteza quanto à fecundidade os faz “insistir no treino”. A biologia e a cultura se misturam: hoje, as mulheres podem usar a ovulação oculta para ter aventuras extraconjugais, e os homens, inconscientemente, se tornam mais atenciosos com suas esposas nesse período.

Mulheres casadas, em busca de material genético de qualidade, fantasiam com outros homens ou “pulam a cerca”, mas, em geral, não buscam mais parceiros do que eles. Estudos mostram que 10% das crianças não são filhos biológicos do marido da mãe, e que os homens têm pelo menos três vezes mais relações casuais do que as mulheres. Segundo David Buss, evolucionista, o sexo casual feminino ainda é restrito aos grandes centros.

A voracidade sexual masculina, conhecida como “efeito Coolidge”, reflete a meta biológica de fecundar o maior número de parceiras. Os machos de muitas espécies, incluindo o homem da idade da pedra, eram insaciáveis. O fato de os homens serem 15% maiores que as fêmeas sugere que havia competição violenta entre eles. A amizade com um rival também pode ser uma estratégia: machos menos vistosos podem se aproveitar da amizade com o “macho alfa” para ter acesso às fêmeas, assim como amigos podem trair uns aos outros para conquistar a parceira do rival. Além disso, a evolução deu aos homens a capacidade de se apaixonar rapidamente, e depois se desinteressar, algo que as mulheres detestam.

A psicologia evolutiva mostra que quando buscam uma parceira fixa, os homens se tornam tão seletivos quanto as mulheres. Eles procuram beleza e juventude, o que fica evidente em agências de relacionamento, onde muitos quarentões buscam mulheres de 20 a 30 anos. O casamento também causa uma mudança biológica nos homens, com a redução de testosterona, tornando-os mais pacatos e focados na família.

A busca por um parceiro segue um “darwinismo social”. Nas cidades maiores, as mulheres valorizam a estabilidade financeira e profissional, enquanto nas menores, buscam qualidades morais e sentimentais. Apesar das diferenças, homens e mulheres compartilham a maioria de seus “adornos sexuais” – o gosto pela arte, linguagem e poder –, o que nos torna únicos. A pavoa não precisa de uma cauda para admirar a do macho, mas os humanos precisam se aprimorar na cultura para julgar os méritos uns dos outros. A seleção sexual, o mais primitivo de nossos instintos, é o que nos torna civilizados.

Baseado Revista Veja – 23/07/2003
por Isabela Boscov e Marcelo Marthe


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