Duas coisas atrapalham a vida: o
divertimento e o tédio.
1. O divertimento. O divertimento seria o seguinte: Você deseja o que você não tem e de repente você consegue o que você tem ai você não deseja mais e ai você passa a desejar outra coisa. O divertimento seria trifásico: querer o que não se tem, conseguir o que se desejava antes e buscar outra coisa que agora se deseja. O divertimento é marcado por um pêndulo. Ou você deseja e não tem ou você tem e não deseja mais e depois volta a desejar o que não tem. Seria como beber água. É a lógica da saciedade impossível.
2. O tédio. E ele seria caracterizado por uma rede de utilidade. O útil sempre foi entendido como uma coisa boa e a inútil como uma coisa ruim. No entanto perceba, que quando uma coisa é útil o seu valor esta fora dela. Assim o veículo é bom porque permite o deslocamento para um lugar onde você não está. O valor do primeiro está no ginásio, o valor do ginásio está no colegial, o do colegial na faculdade, o da faculdade no emprego, do emprego... Portanto se um dia você te chamarem de inútil não fique tão triste assim. Quanto mais na nossa vida encontrarmos coisas que tem valor em si mesmas e, portanto sejam inúteis as chances de vivermos melhor aumenta muito.
O divertimento é um ciclo de insatisfação: desejar o que não se tem, conseguir, e em seguida, buscar outra coisa. É uma busca incessante pela saciedade, que nunca é alcançada. O tédio, por outro lado, surge de uma rede de utilidade, onde o valor das coisas está sempre fora delas mesmas. O valor de um carro está no destino que ele leva você. O valor de uma faculdade está no emprego que ela pode proporcionar.
Assim, o valor de algo útil é sempre externo a ele. Por isso, o autor sugere que não devemos ficar tristes se nos chamarem de inúteis, pois quanto mais coisas em nossa vida tiverem valor em si mesmas, maiores serão as chances de vivermos melhor.
A perspectiva de vida de Nietzsche exige uma avaliação que parte de si mesmo, sem fatores transcendentes. O valor das coisas não é inerente a elas, mas é determinado pelo desejo e pela vontade de cada indivíduo. O conceito do eterno retorno, através de uma famosa citação de Nietzsche. A ideia é: você gostaria de viver sua vida, com cada momento de dor e alegria, inúmeras vezes? A resposta a essa pergunta é o que determina se a sua vida é boa. O eterno retorno não é uma rotina, mas um desejo de que um instante se eternize, o que é o sintoma de uma vida bem vivida.
Nietzsche, como um filósofo vitalista, acreditava que toda transcendência são “muletas metafísicas” para quem não consegue suportar a vida como ela é. A invenção de conceitos como justiça ou matemática é uma forma de compensar o desespero da finitude. O super-homem de Nietzsche é aquele que vive sem essas muletas, abraçando o “amor-fati” (amor ao destino). O real é o que é; o erro não está no mundo, mas na nossa avaliação sobre ele.
Transcrição de textos e vídeos do professor Clóvis de Barros Filho, filósofo e docente de Ética na Escola de Comunicações e Artes da USP (ECA/USP).
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